Já provei muitas faces da Dor. Ela é constante na Existência. Sempre me acompanhou pra onde eu vá desde cedinho, com a mente ou o corpo físico incorruptível (logo é mutação infindável, segredos, sedução). Nossa relação íntima é tão estranha que ocorrem instantes em que eu a desejo, outros eu a repugno, e ela fiel permanentemente, comigo está, parte integrante de mim já é há não sei que tempo. Amiga e algoz, a Dor me surpreende muito. Tristezas e desgraças me trouxe, e alegrias também. Não sei do que seria estruturas do Eu sem a tão demonizada e endeusada Dor!
Aqui, contudo, não me prenderei ao perfil ambivalente da Dor. Me restringirei a sua capacidade fragilizadora de sinceridade – pelo menos tentarei! – sinceridade? Monstro emana verdade? Claro. Todos emitem sim! Agora, que monstro, por que monstro? Não seria monstro aquele que traz ruína para muitos e muitas, em consciência ou não? Verdade. Assim ninguém escapa da natureza Monstro! Somos: eu, você e ele criaturas horrendas que destroem outrem para satisfazer seus Movimentos de Vaidade. E produzimos, sim, verdade, mesmo sendo Monstros: a espécie de coisa que possui uma outra Beleza e esboça a Outra Arte, aquela que é temida por esfacelar tudo aquilo já programado, e controlado, e esperado, e conhecido, e humanizado, e desumanizado, e restringido, e modificado.
O olhar preconceituoso é uma forte arma! Muito eficaz, consegue desequilibrar a atenção do mais soberbo ser. Ele penetra minha alma, desdenha ela sarcasticamente, indicando os pulsos de minha imagem como algo nãotolerado, nãopossível, perigoso, destinado à extirpação dramática, por apenas ser distinto. É dificílimo estar diferença nessa biosfera (ou melhor descrevendo cidiosfera) que vai de encontro à razão e emoção da Vida: a diversidade, a diferença de movimentos muitos, todos integrados e maravilhosos, maravilhados! Mas o mais oneroso é se assumir como tal: polemicidade. Ai que Dor é Tentar estar o que se é em permissibilidade. Muitos têm a vontade, poucos são loucos! E, para aqueles que se deleitam no prazer sem-igual da transgressão da sanidade, amar-se e amar é fantástico, apesar de tanta Dor! Alguns raros amam o dissonante, muitos outros o possuem em ódio. Ambos ganham em sua postura, todos perdem com sua ousadia, e nunca a Dor os abandona, ao louco e aos que tocam o louco com a curiosidade do amor ou do desdém. Sempre haverá, no mínimo, dois retornos para cada encenação de Vida.
Quando firo a extensão de minha vaidade, aquele que amo, trago, em cadeias, a dor que causo a ele; essa é a Dor do tolotorpe que fui ao espatifar o espelho no qual eu deitava nudez, você: a quem eu derramo amor. Como posso corta meu próprio nariz? Desgraça! Como consigo ser o meu próprio término? Sou egoísmo, estou usura de vontades unicamente orbitantes dos meus limites de ocorrência. Devagar! Você é próximo a mim, igualmente capaz de cometer coisas parecidas, ou outras jamais imaginadas por mim! Note: só pessoas queridas podem nos trair, porque dos inimigos já esperamos o mal; quanto aos amigos, desses aguardamos, cândida e tolamente, apenas o cultivo do carinho, respeito, admiração e servidão. Quem sabe se é aí onde se resguarda e se agigantece nossa falha maior com aqueles junto aos quais acreditamos direcionar amor? Mesmo assim é muito difícil entender como o amante pode causar destruição ao amado. A resposta deve se apoiar sobre a própria natureza destrutiva do humano, a qual anseia a corrosão contínua e crescente do seu lar, onde habita e do qual reclama sua existência. Somos também demônios. Ou talvez nada disso, ou a interseção dessas coisas com outras. Em fim, sou humano? Também.
Há uma Dor que me excita o caminhar para o massacre de mim mesmo: a Dor que chega da incompreensão e má interpretação do que sou-estou. Paciência... Sempre fui mal interpretado e não-entendido. Não fui o primeiro, nem serei o último a sofrer com isso. Mas o que me importa essa falácia toda? O que vale é essa Dor muito forte, que não cabe mais em mim! O que fazer? Mudar? Esfacelar-me? Desconfigurar meus contornos do ser ocorrência? Maximizar a capacidade de dissimilar? Potencializar o simulacro que me fazem e me faço ser? Ainda não sei o que é bom. Vamos provar um pouquinho de cada... Rsrsrsrs... É chorando que aporto na reflexão. É sendo derrubado e caindo que me enrijeço. Procuro não me enganar quanto ao que sinto e ao que almejo. Verdades e mentiras tudo pode ser. É por isso que prefiro o contínuo. Sou eu logo a continuidade da mosca, do verme, do mofo, da espada, do sol, da água, do solo, de você, do outro, dos outros; eu nada mais sou do que a soma de muitos outrem.
Pois é... É duro olhar nos olhos daquele que nos fez ou faz plantar a Dor no íntimo nosso, principalmente quando ele é o nosso amado. Ato contínuo, é ainda mais sério ser, justamente, aquele junto ao qual o olhar do amante ofendido chega em outros moldes ou simplesmente não chega, o que denuncia a pior das represálias: a indiferença. Ser amado ou odiado por quem nos ama ou amou é o demonstrar da importância que ainda somos para ele; fato que mantém aceso nossa vaidade e esperança. Por outro lado, a ignorância completa – se é que ela existe! – afeta em cheio nossa imagem, não somos o que esperávamos ser, perdemos mais um veículo que comprovava nossa existência; estamos morrendo... Mas há contornos. Todo indivíduo pode mudar. O começo é a auto-consciência do erro cometido, seguida da implantação da ansiedade em evitá-lo e continuada vontade de persistir nessa empresa incansavelmente. Eu posso mudar, você pode, nós somos mudança! A Mudança é o sustentáculo da vida! Eu quero mudar. Eu já sou-estou transformação.
Eu amo! Eu me amo e amo a outrem. O meu coração reconhece no seu a esperança que nunca finda: a força propulsora de ter as respostas dos beijos esboçados. Só os puros de coração detêm a capacidade de perdoar, ato que desafia nossa Vaidade e Orgulho. Siga o seu coração. Será que há desgraça tão pujante que alicerce o abandono do desejo profundo de seu coração, Ser Amado Ofendido? Tente perceber e receber em outras perspectivas o seu Algoz Amante. Falar é fácil, escrever nem tanto, e fazer complicado. Aí é o peso da Dor que cada um leva consigo que ditará como as coisas serão procedidas. As regras estão sendo traçadas... Cuidado! Pense bem no que fará. Talvez sua atitude agora te traga mais Dor. O Monstro que fui e sou também é reflexo do que você foi e é, é espelho do que é humanidade. Como Monstro, possuo igualmente a capacidade de amar, assim como você, Herói Ofendido. Quem nunca foi Monstro saiba que nunca amou além de seus próprios limites; e quem nunca se fez Herói ofendido tenha a certeza que nunca sentiu a delícia da Dor de quem tem a certeza de que amou e ama. Amar é mais que transgredir... Muito mais, mais, além.
Diógenes Pereira. Salvador, ba 12.05.2008
Legal o seu texto cara. A dor por si só possui uma nuance tão significativa na vida do ser humano que é interessante analisarmos isso de vários aspectos e de forma pessoal.
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